Cinco pacientes que ficaram com sequelas graves após sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) têm mostrado pequenos sinais de recuperação após uma injeção de células-tronco no cérebro.
Os cinco pacientes estão participando de um teste clínico no Southern General Hospital, em Glasgow, na Escócia, que ao todo envolve nove pacientes de 60 a 80 anos. A pesquisa, uma das primeiras do mundo desse tipo, pretende avaliar se o procedimento, que prevê uma injeção de células-tronco na parte danificada do cérebro, é seguro.
Keith Muir, responsável pelo experimento na universidade, disse à BBC estar “surpreso” com a melhora, que vai de leve a moderada, dos cinco pacientes. Ele ressalta que ainda é muito cedo para dizer se o efeito é resultado do tratamento que as pessoas estão recebendo.
Já foi bastante documentado que o sentimento de bem-estar resultante de uma atenção médica especial dada a pacientes, conhecido como efeito placebo, pode ter uma ação positiva sobre a saúde.
Os resultados, que serão apresentados nesta terça-feira (28) na European Stroke Conference (Conferência Europeia sobre Derrame) em Londres, mostram que até agora não houve efeitos adversos nos participantes, e que mais da metade deles tem apresentado algum tipo de melhora.
Melhoras que fazem diferença
Todos os pacientes envolvidos no estudo sofreram um derrame entre seis meses e cinco anos antes de receber o tratamento. De acordo com Muir, a recuperação de qualquer um deles não era esperada. “Parece estranho que essa melhora seja apenas por acaso ou um efeito placebo”, disse à BBC.
“Estamos vendo coisas que são interessantes e um pouco surpreendentes. Temos visto pessoas que agora têm a capacidade de mover os dedos depois de vários anos de paralisia completa. Temos visto pacientes que foram capazes de andar dentro de casa enquanto anteriormente dependiam da ajuda, e pessoas que passaram a reconhecer o que está acontecendo ao seu redor.”
“Minha expectativa era de que veríamos uma mudança muito pequena, e, se houvesse alguma mudança, seria relativamente curta, que não duraria muito tempo. (Mas) temos visto mudanças que foram mantidas ao longo do tempo”, afirmou Muir.
Frank Marsh, de 80 anos, teve um acidente vascular cerebral há cinco anos. Antes do derrame, o ex-professor estava em forma e era um pianista bastante ativo, membro de um coral.
O AVC o deixou com pouca força e coordenação na mão esquerda, além de falta de equilíbrio. Ele precisa de uma bengala para ajudá-lo a se mover ao redor da casa e não pode mais tocar piano.
Após a injeção de células-tronco na área danificada do cérebro, o equilíbrio e a mobilidade de Marsh melhoraram, assim como sua força na mão. Ele agora pode amarrar o cadarço dos sapatos.
“Agora posso segurar as coisas em que eu não conseguia aderência antes, como os corrimãos das piscinas”, disse.
Segunda fase
Clare, mulher de Marsh, que também é professora, afirmou que as pequenas melhoras deixaram o marido mais independente.
“Ele atingiu um estágio após o derrame em que não estava mais apresentando melhoras”, disse Clare. “Mas, após a operação, ele é capaz de fazer coisas que não podia fazer antes, como preparar café, vestir-se e segurar as coisas.”
Marsh acrescentou que espera que as melhoras continuem: “Eu gostaria de voltar para o meu piano. Gostaria de andar um pouco mais e mais firme”.
No entanto, Clare sente que não haverá mais progressos para o marido, mas espera que outros possam se beneficiar do teste clínico.
“O grande potencial do experimento é o que ele pode fazer para o futuro”, disse Clare. “Eu disse a Frank no início que o tratamento poderia não ajudá-lo, mas poderia ajudar nosso neto.”
Clare está certa: mesmo que se prove que o tratamento com células-tronco funciona, será um longo caminho até que ele esteja amplamente disponível. Os resultados até agora abrem caminho para uma segunda fase do ensaio clínico, que deverá começar no final do ano e pretende determinar se as melhoras realmente resultam do tratamento.
Se a fase dois confirmar que as células-tronco são a causa das melhoras, uma terceira fase será necessária para avaliar para que tipo de paciente o tratamento será mais adequado, e em que estágio ele será mais eficaz.
Aprovação ética
Comentando a pesquisa, Clare Walton da Stroke Association, disse: “O uso de células-tronco é uma técnica promissora que poderá ajudar a reverter alguns dos efeitos incapacitantes de acidente vascular cerebral. Estamos muito entusiasmados com esse ensaio clínico, no entanto, estamos no início de um longo caminho, e um desenvolvimento significativo é necessário antes da terapia celular poder ser considerada um possível tratamento.”
As células-tronco foram criadas há dez anos, a partir de uma amostra de tecido nervoso retirada de um feto. A empresa que produz o material, ReNeuron, é capaz de fabricar quantas células-tronco precisar a partir de uma amostra inicial.
O tratamento tem sido criticado justamente por envolver o aproveitamento de amostras fetais. Entre seus principais críticos, está o parlamentar e ativista antiaborto David Alton. “O verdadeiro doador (o feto) não poderia ter dado seu consentimento, e por isso esse tipo de tratamento levanta questões éticas importantes”, disse.
A ReNeuron, que financiou o estudo, afirma que o experimento tem aprovação ética das autoridades reguladoras. A empresa acrescenta que a amostra de tecido foi usada no desenvolvimento de células-tronco há dez anos, e que material fetal não tem sido utilizado desde então.
Fonte: G1