Livro recupera trajetória do Roupa Nova

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A questão da autorização prévia para biografias no Brasil ainda não havia tomado a dimensão dos últimos meses quando a jornalista Vanessa Oliveira começou a escrever Tudo De Novo, livro que conta a história do Roupa Nova e leva em seu subtítulo a palavra “oficial”. Mas, procure saber: o adjetivo não caracteriza o livro como chapa-branca. Bem apurada, a publicação relata sem maniqueísmo as personalidades de cada um dos seis integrantes, o preço do sucesso e, principalmente, a capacidade de se adaptar dentro do mercado que os forjou.

Inicialmente, o grupo resistiu à ideia do livro. Na primeira reunião entre a autora e os músicos, em 2010, eles perguntaram a Vanessa se o livro seria publicado mesmo sem autorização. “Se vocês não autorizarem eu coloco de graça na internet. A história de vocês precisa ser conhecida”, foi a resposta. Aos poucos, Cleberson Horsth, Ricardo Feghali, Kiko, Nando e Paulinho abriram suas casas, corações e baús. A exceção foi Serginho. De personalidade reservada, não forneceu depoimento e nem compareceu às sessões de autógrafos do livro.

“No caso do Serginho, tive de recorrer a outras fontes. Ele é uma pessoa que gosta de manter a vida privada. Mas nada foi imposto em nenhum momento por nenhum deles, ninguém me impediu de nada”, afirma Vanessa, fã do Roupa Nova desde criança. Ela conta que sua principal motivação ao escrever o livro era desfazer alguns mitos, entre eles o de que o grupo só fez sucesso por conta de músicas em trilhas de novela.

Os integrantes do Roupa Nova começaram a carreira no final dos anos 1960, em conjuntos de baile do subúrbio carioca. Na década seguinte se aglutinaram na banda Famks, com a qual registraram diversos compactos, dois LPs e álbuns com sucessos do momento. Em 1979, o produtor Mariozinho Rocha, então na gravadora Polygram, precisava de um grupo no estilo de A Cor do Som e 14 Bis para seu elenco. Foi ele quem batizou o grupo, inspirado na música de Milton Nascimento e Fernando Brant.

Baile. Mas foi graças a um impulso agressivo de um dos integrantes que o Roupa Nova passou a existir definitivamente. O livro relata que o grupo chegou aos anos 1980 dividido entre o dinheiro garantido como Famks e a possibilidade de uma carreira com nova denominação. Após um baile no interior de Minas sob o antigo nome, vendo os colegas comendo churrasco com farofa e batata frita de lanche, o guitarrista Kiko ficou paralisado e reagiu, chutando o tabuleiro com a comida. “É isso que vocês querem? Porque não é isso que eu quero”, disse. Foi – literalmente – o pontapé que faltava para convencer os outros músicos.

A partir de 1984, com a ida para a RCA, o grupo chega ao seu auge comercial. O primeiro disco na gravadora teve total interferência do produtor Miguel Plopschi. Tudo de Novo mostra que os integrantes ficaram divididos entre entregar o álbum nas mãos de Plopschi, que queria torná-los mais pop e comerciais, ou manter a linha dos álbuns anteriores, com repertório fornecido por compositores alinhados com a MPB. A partir daí, o grupo emplaca hits como Whisky A Go Go e permanece nas paradas de sucesso até o início dos anos 1990, quando o sertanejo e o pagode passaram a reinar absolutos.

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O renascer da banda acontece nos anos 2000, após o projeto Roupacústico, bancado pela própria banda. A ideia inicial era de que o Roupa Nova gravasse um Acústico MTV. Mas a emissora negou a proposta, alegando que a banda não atingia seu público-alvo. “Eles sofreram muito preconceito desde o início, porque têm diversas influências e não se encaixam em nenhum estilo. Foi o talento deles e a vontade de fazer música, além do contato com o público, que os fez permanecer na ativa”, observa Vanessa.

O livro também disseca os bastidores das colaborações do Roupa Nova com grandes nomes da MPB. Milton Nascimento, fã de primeira hora da banda, chamou o grupo para fazer a base de duas músicas do álbum Caçador de Mim (1981), entre elas Nos Bailes da Vida, e se tornou uma espécie de padrinho da banda. Com Rita Lee e Roberto de Carvalho, eles participaram do álbum lançado pela dupla em 1982, no qual consta Flagra e Cor de Rosa Choque.

E artistas internacionais também cruzaram seus caminhos com o do grupo, como o ex-Deep Purple e vocalista do Whitesnake David Coverdale. Enquanto o inglês ficou encarregado de interpretar o jingle de uma marca de cigarros, a banda fez a base instrumental. O cantor questionou a pronúncia de trechos da letra e quase abandonou o estúdio quando o Roupa Nova tocou, de improviso, Smoke On The Water. “Uau, nunca vi essa música ser tocada tão bem”, disse ele. A partir daí, tudo transcorreu sem problemas.

Pra recordar:

https://youtu.be/AbJH_oakRy8

Roupa Nova e Milton Nascimento Nos Bailes da Vida

https://youtu.be/lSDi8GTlCZc

Rita Lee & Roberto De Carvalho – Flagra

https://youtu.be/8hCFLZr5jy0

Rita Lee & Roberto De Carvalho – Cor De Rosa Choque

Fonte: Estadão