O Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo (USP) pretende criar um banco de dados com informações sobre o DNA de mil idosos saudáveis acima de 80 anos. O objetivo do “Projeto 80+” é conhecer a genética e o funcionamento cerebral de pessoas que estão envelhecendo bem, principalmente do ponto de vista do funcionamento do cérebro.
Essas informações vão servir de referência para a população brasileira e podem contribuir para se entender melhor o processo de envelhecimento.
“Vamos usar esse material para compará-lo com o de jovens. Se acharmos uma mutação no DNA de uma pessoa mais nova, por exemplo, poderemos usar nesse banco de dados para saber se ela se repete nos mais velhos e, portanto, se é normal”, explica a geneticista Mayana Zatz, diretora do centro.
Por enquanto, o programa – feito em parceria com a Faculdade de Saúde Pública da USP e do Hospital Israelita Albert Einstein – reúne o cadastro de cerca de 400 voluntários — faltam 600. Os moradores da cidade de São Paulo interessados em contribuir podem entrar em contato com a universidade, por e-mail.
Os candidatos selecionados preenchem formulários, questionários e fazem uma avaliação para ver se estão dentro do perfil solicitado. Isso inclui uma coleta de sangue para obtenção do DNA e uma ressonância magnética no Hospital Albert Einstein, para observar a atividade cerebral durante alguns testes.
Passada essa fase, quando todos os mil idosos passarem por ela, o genoma deles será finalmente analisado.
“Há cerca de três milhões de diferenças no DNA de uma pessoa para outra. Algumas alterações genéticas fazem os olhos serem castanhos ou azuis, e há outras responsáveis por doenças”, diz a geneticista.
Voluntárias
Uma das pessoas que já colaboraram com o Projeto 80+ é Hermínia Henrique de Souza, de 102 anos. Apesar da idade avançada, a baiana de Ituaçu, que vive na capital paulista desde 1950, fala bem, com clareza e bom humor.
Herminia sente dores por causa de uma artrose nos dois joelhos, anda, vê e ouve com certa dificuldade – usa aparelho auditivo –, e está com as taxas de ácido úrico altas, mas a mente funciona muito bem. Ela já faz parte do projeto Sabe (Saúde, Bem-estar e Envelhecimento), da Faculdade de Saúde Pública, que avalia a situação de idosos acima de 60 anos.
“A pontuação do teste cognitivo dela foi comparável ao de qualquer pessoa sem declínio mental, considerando especialmente que ela não conseguiu fazer as atividades de leitura por causa da dificuldade visual”, diz Michel Naslavsky, integrante do projeto.
A idosa conta que nunca casou, embora tenha ficado noiva uma vez, nem teve filhos. Hoje mora com dois sobrinhos, que a ajudam. Ela tem 12 irmãos, mas do primeiro casamento do pai restou apenas ela, entre seis pessoas.
Dos sete irmãos da segunda união do pai, ainda há um casal de filhos que vive na Bahia e outro casal em São Paulo, mas a mais velha deles ainda está na casa dos 70 anos.
“Minha carteira de identidade diz que tenho 97 anos, mas é que fui registrada cinco anos depois de nascer. Naquela época era muito comum”, lembra.
Além de Hermínia, participam do projeto da USP os irmãos Jandyra Anna Giopatto, de 80 anos, e Waldomiro Bonito, de 83.
“Se for para viver com saúde e a cabeça boa, tudo bem”, diz Jandyra, que ainda tem outro irmão, de 88 anos, e uma prima que vai fazer 100.
A dona de casa ficou viúva quando o marido tinha apenas 32 anos, vítima de câncer no fígado. Teve três filhos, mas só dois estão vivos: uma de 59 anos e outro de 55 anos. O terceiro morreu por complicações após um acidente de moto.
Ela é independente, mora sozinha, e o irmão também, na casa ao lado. Jandyra diz que arruma a casa, faz café, vai à feira e à missa. Costuma acordar cedo, entre 5h e 6h30. Só reclama de uma dor muscular na perna esquerda, cuja origem não aparece nos exames.
“Na avaliação, fazem mil e uma perguntas: como a gente se dá com irmãos, amigos e filhos, qual atividade faz, o que sente, o que não sente”, enumera a idosa.
O irmão dela teve paralisia infantil aos 2 anos, mas está bem apesar da dificuldade de locomoção. Ela conta que Waldomiro é menos ativo, operou o coração há 12 anos, mas gosta de jogar carta de vez em quando.
Fonte: G1